Imagine que existe um processo de execução contra a “Empresa X”, e que todas as diligências a fim de se encontrar bens passíveis de penhora em nome da empresa sempre restaram negativas, mas a exequente sempre verifica nas redes sociais que os sócios da empresa ostentam uma vida de luxo, comprando bens e financiando uma vida que não condiz com uma empresa sem bens e falida.
A solução para o credor ter seu débito adimplido pode ser a Desconsideração da Personalidade Jurídica, a fim de que o juiz retire a proteção patrimonial que a empresa possui, atingindo assim o patrimônio pessoal de cada sócio, tendo a exequente a possibilidade de recuperar o seu débito.
A possibilidade da Desconsideração da Personalidade Jurídica encontra respaldo legal no artigo 133 e ss do Código de Processo Civil, bem como no artigo 50 do Código Civil.
Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso.
Portando, para poder ser decretada a Desconsideração da Personalidade Jurídica é necessária a comprovação de desvio de personalidade ou confusão patrimonial. O desvio de personalidade ou desvio de finalidade ocorre quando os sócios ou administradores utilizam a sociedade para fins diversos daqueles almejados pelo legislador, ou seja, fora do objeto societário. Já a confusão patrimonial é quando existe uma confusão de bens da empresa com os bens dos sócios ou administradores, ou seja, casos em que a pessoa jurídica serve de instrumento para acobertar atos ilícitos, como quando a pessoa jurídica transfere todo seu patrimônio para a pessoa física dos sócios com o objetivo de fraudar os credores.
Mas agora suponha a situação inversa, um processo de execução contra uma pessoa física que tramita a certo tempo e nunca foi possível encontrar nenhum bem passível de penhora para satisfazer o débito. Em dado momento a exequente descobre que essa pessoa física possui uma empresa de venda alimentícia e que ela está auferindo lucro com essa empresa. Ou um exemplo ainda mais grave, mas que se visualiza no cotidiano com facilidade, em que uma pessoa física cria uma pessoa jurídica de fachada apenas para transferir seus bens e patrimônios pessoais, justamente acreditando que o manto e a proteção da pessoa jurídica nunca serão rompidos e ela continuará fraudando credores e pessoas de boa-fé.
Pensando em situações como essa, foi criado o incidente da Desconsideração Inversa da Personalidade Jurídica, sendo justamente uma ferramenta que objetiva o afastamento da autonomia patrimonial da sociedade empresária, devendo essa solução ser utilizada quando o sócio se utiliza da pessoa jurídica para proteger os bens que seriam de seu patrimônio pessoal.
A desconsideração inversa também segue os mesmos preceitos legais da desconsideração comum, devendo comprovar desvio de personalidade ou confusão patrimonial dos sócios, para poder o juiz analisar o caso concreto e decretar a desconsideração, tendo o credor grandes chances de haver seu débito adimplido.
Verifica-se, portanto, que a desconsideração e a desconsideração inversa da personalidade jurídica podem ser uma grande solução para o credor ter seu débito adimplido, considerando que não pode ser admitido o abuso de direito, a fraude à lei ou prejuízo à terceiro, fazendo com que tanto as pessoas físicas, quanto as pessoas jurídicas sejam responsabilizadas e não saiam impunes aos abusos cometidos.
Patrick Luan de Almeida
Auxiliar Jurídico no escritório Carminatti & Dangui Advogados Associados | Estudante de Direito – Centro Universitário Campo Real.